Vai fazer praticamente um ano que escrevi isto:
Não sei se a felicidade é um destino, um caminho ou simplesmente uma maneira de encarar a vida. Só sei que seja o que for, neste momento tenho-a ao máximo. Claro que, insatisfeita que sou, aceitava de bom grado muitas coisas que a complementariam, como uma gatinha para me fazer companhia quando chego a casa... Também sei que, mais tarde ou mais cedo, posso revisitar este meu estado de espírito eufórico e pensar mal eu sabia.
Mas prefiro não pensar nessa eventualidade. Não para já quando três dias numa só semana já chegaram para várias voltas alucinantes no carrossel louco da vida.
Tudo corre bem.
Hoje escrevo: mal eu sabia, de facto.
Chegar ao fim de uma história que me deixou sem nada tem-me tirado as forças. Dormir é a melhor parte do dia, mas é também algo complicado de fazer quando se tem a cabeça completamente ocupada e o coração perdido e despedaçado.
No dia em que penso que não se pode bater mais no fundo, em que as coisas até começam a endireitar-se e a prometer correr bem, há qualquer coisa de estranho que me acontece e que, se numa situação normal me faria rir, neste momento aterroriza-me ante a possibilidade de poder acabar esquartejada numa qualquer rua da cidade sem que ninguém me encontre.
É verdade que ninguém me manda ficar fora de casa até quase à uma da manhã de um dia de semana, mas foi isso que aconteceu ontem. Sou crescidinha, pensei. Nada de mal pode acontecer.
Lugar à porta de casa é mentira, pelo que parei o carro em frente a uma garagem e enfiei as tralhas dentro do prédio sob o olhar atento (creepy?) e os comentários de um homem na paragem de autocarro.
Entrei no carro e fui procurar um lugar. Descobri uma rua cheia deles, mas tive de parar exatamente em frente ao caixote de um sem abrigo, que saiu de lá de repente, pregando-me um susto de morte, e me gritou "boa noite, menina!".
Fiquei meia hora dentro do carro, mesmo mesmo em frente a ele, a tentar ganhar coragem para sair.
Hoje de manhã, de dia - com luz do dia é tudo mais fácil - cheguei ao carro confiante de que tinha sido apenas um susto sem repetição e dei com uma Vogue em cima do tejadilho do carro. Agradeci a ninguém e pu-la no chão.
Entrei no carro para vir embora e vi o sem-abrigo da véspera a correr rua acima e a dizer-me:
- Esta noite iam roubar-lhe o carro! Mas eu disse "o coreano não, leve antes o BMW".
Pisquei os olhos, agradeci-lhe.
Agora que estou a salvo, vou literalmente enrolar-me em posição fetal e chorar desalmadamente.