Estava sentada no sofá a escrever e a pensar na minha vida quando comecei a sentir um leve cheiro a fumo que entrava por dentro de casa, vindo da zona da cozinha. Verifiquei que não tinha nada ligado em lado nenhum da casa e concluí que o fumo tinha de vir de fora, pelo que espreitei pela janela e, de facto, vi qualquer coisa que, pensando bem nisso, acho que era só nevoeiro. Como não seria a primeira vez que tal acontecia, fechei as janelas todas e desvalorizei o assunto.
Cerca de quinze minutos depois o cheiro tinha-se intensificado e parecia que alguém estava a fazer torradas na minha cozinha. Levantei-me e fui, mesmo, fazer torradas. Enquanto esperava por que a torradeira desse sinal, ouvi coisas a cair no chão de cima, o meu teto. Mas também não era uma coisa estranha na minha vizinha. No entanto, trouxe as torradas para a sala e comentei com o meu namorado no chat que a vizinha parecia estar a destruir a casa e que achava que o nosso teto ia ruir.
Ainda não sei como não somei 1+1...
Foi então que ouvi a campainha tocar e levei atrás de mim o prato com as torradas a que só tinha dado uma trinca. Sabem aquele hábito irritante que os carteiros e os distribuidores de publicidade têm, de tocar para todas as campainhas ao mesmo tempo? Foi isso que fizeram, por isso não consegui ver quem tocava. Normalmente encolheria os ombros e voltaria para o que estava a fazer, mas desta vez achei que alguma coisa não estava bem, facto que comprovei quando ouvi duas pessoas que trabalham no edifício que dá para as traseiras do meu e que deram conta do que se estava a passar a subirem as escadas e a baterem em todas as portas.
Há um incêndio no prédio, saiam já!
Tive tempo de pousar o prato das torradas, calçar-me, pegar no blusão que a minha mãe me tinha emprestado na véspera e de pôr a carteira ao ombro apenas com o porta moedas e o telemóvel quase sem bateria. Ainda pensei no que levar comigo, mas comecei a dar conta de que era tanta coisa, tanta roupa, tantas fotografias, que acabei por desligar, só, o computador.
Só quando desci é que vi que as janelas da lavandaria do andar por cima do meu tinham implodido e explodido e que a persiana estava toda derretida. Acho que foi isso que ouvi cair no chão.
Vieram dois ou três carros dos bombeiros e um carro cheio de polícias, chegou o INEM e ninguém sabia se a senhora (aquela velhinha um bocadinho senil de quem já aqui falei algures) estava lá dentro ou não, porque tinham pontapeado a porta, tocado à campainha e ligado para o telefone dela, mas ela não tinha respondido.
Achei que das duas uma: ou não estava lá porque tinha ido passear, ou estava lá dentro e já não havia nada a fazer.
Entretanto estava na rua, debaixo da chuva, a dizer ao meu namorado para ir ter comigo e que íamos ficar sem casa, porque aquilo ia tudo explodir. E sim, achei mesmo que ia ficar sem casa. Pensei que fosse desmaiar de tanto tremer, porque a sensação de ver aquilo a arder e de correr o risco de ficar sem casa e sem tudo o que tenho dentro de casa foi terrível. Olhei para o dedo e verifiquei que não me tinha esquecido do anel.
Os bombeiros lá conseguiram tirar a mulher que estava, incrivelmente, consciente e sem queimaduras e apagaram o fogo. Veio a PSP, veio a televisão, veio uma data de mirones.
Entrei em casa para ver se não tinha fumo nem inundação. Tudo ok.
Pediram-nos para entrarmos em casa da senhora porque, embora de forma muito afastada, é mais ou menos da família do meu namorado. Foi então que vi que tudo na cozinha, tirando os armários, tinha caído e/ou partido contra o chão/o meu teto. A casa estava desfeita, toda suja e não se via nada. Limpámos a água para não termos infiltrações, ficámos a cheirar a fumo e deitei-me cheia de medo de que houvesse um curto circuito lá em cima.
Decidi que neste fim de semana vamos comprar pelo menos quatro detetores de fumo. E passei a noite a ter pesadelos.